terça-feira, 30 de março de 2010

Portugueses desenvolvem método de diagnóstico precoce da síndrome de transfusão

Investigadores do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) descobriram um método que permite diagnosticar precocemente uma complicação grave que atinge 15 por cento das gravidezes de gémeos verdadeiros: a síndrome de transfusão feto-fetal.

Embora esta doença seja habitualmente detectável a partir da décima sexta ou décima sétima semana de gestação, agora Nuno Montenegro e Alexandra Matias melhoraram de forma considerável o prognóstico, provando ser possível antecipar o diagnóstico para a décima primeira ou décima terceira semana através da avaliação do fluxo sanguíneo no ductus venoso, uma pequena veia que liga o cordão umbilical ao coração do feto e que assegura a passagem de sangue rico em oxigénio.

Síndrome de transfusão feto-fetal - O que é?

A síndrome de transfusão feto-fetal afecta as gravidezes nas quais existe apenas uma placenta, partilhada pelos dois fetos, e dois sacos amnióticos (gravidezes gemelares monocoriónicas biamnióticas). Em alguns casos, os gémeos compartilham também o sistema circulatório dentro da placenta, o que dá lugar à transfusão do sangue de um gémeo (dador) para o outro (receptor). O gémeo dador torna-se menor e anémico e o gémeo receptor cresce mais e fica congestionado. Se este problema não for detectado e solucionado atempadamente conduz, de forma inevitável, à morte dos dois fetos.

No artigo científico publicado na última edição revista científica Ultrasound Obstetrics and Gynecology, os cientistas demonstraram que a avaliação do retorno venoso no ductus permite detectar a existência de síndrome de transfusão feto-fetal com uma sensibilidade na ordem dos 80 por cento. De acordo com os investigadores, quando um dos fetos, ou os dois, têm problemas de retorno venoso no ductus, o risco de haver partilha do sistema circulatório é 20 vezes maior do que o normal.

Este estudo resulta de uma investigação iniciada em 1996, altura em que os cientistas da FMUP revelaram, num artigo científico que teve grande impacto junto da comunidade científica internacional - existem mais de 200 citações deste trabalho - , que a avaliação do retorno venoso no ductus permite detectar patologias cromossómicas (trissomia 13, 18 e 21) e problemas cardíacos em fetos com 11 a 14 semanas de gestação.

Método revolucionário

Estas informações revolucionaram a prática clínica da Obstetrícia, sendo que actualmente, em todos os países desenvolvidos o teste do ductus venoso (também conhecido como “teste do ductus da Escola do Porto”) é incluído nos rastreios realizados às grávidas, contribuindo para a diminuição dos casos de gravidezes que prosseguem sem que a trissomia ou os problemas cardíacos sejam diagnosticados.

O teste do ductus venoso, associado a outros dois testes - análise da translucência nucal e osso do nariz - e à idade da mãe, consegue predizer a existência de doenças genéticas e cardíacas com uma sensibilidade de 95 por cento.

O diagnóstico da síndrome de transfusão feto-fetal entre os dois e três meses de gestação permite a realização de uma intervenção cirúrgica com melhoria do prognóstico. O problema pode ser solucionado com uma cirurgia invasiva que põe termo à troca de sangue entre os dois fetos, que passam a receber a corrente sanguínea como se fossem “gémeos falsos”.

Embora se trate de uma intervenção com riscos, é a única forma de evitar a morte dos dois bebés. Esta cirurgia ainda não é realizada em Portugal, tendo os casos detectados de ser encaminhados para o King´s College School of Medicine em Londres com o qual existe um protocolo de colaboração na assistência, formação e investigação.

Esta linha de investigação da FMUP em torno do ductus venoso tem mais de 15 anos e já mereceu vários prémios nacionais e internacionais, sendo de destacar o primeiro Prémio da International Society of Ultrasound in Obstetrics and Gynecology, uma Menção Honrosa do Grande Prémio Bial (2008) e uma Menção Honrosa do Prémio Pfizer (2005).


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