terça-feira, 29 de julho de 2014

O MEC E AS COMISSÕES DE PROTECÇÃO DE CRIANÇAS E JOVENS



Segundo o Relatório da Actividades das Comissões de Protecção de Crianças e Jovens em Risco relativo a 2013, aumentou o número de casos, foram acompanhadas 71.567 crianças, mais 2560 do que em 2012. A exposição a situações de violência doméstica, a negligência e casos relativos ao direito à educação (abandono, absentismo ou insucesso escolar) são as situações com maior incidência. É ainda relevante que os casos de crianças abandonadas ou entregues a si próprias quase duplicaram.

Verificou-se ainda o aumento do número de situações de consumos, álcool e droga, bem como de indisciplina severa.

Merece registo positivo a diminuição de casos envolvendo negligência, abuso sexual, maus-tratos psicológicos, abandono, mendicidade e trabalho infantil.

Em termos globais e como habitualmente refere o Juiz Armando Leandro, presidente da Comissão Nacional de Protecção das Crianças e Jovens em Risco, importa ainda considerar que "nem todos os casos chegam às Comissões de Protecção".

Embora não possa ser estabelecida de forma ligeira nenhuma relação de causa as dificuldades severas que muitas famílias atravessam e a insuficiência de apoios sociais não serão alheias a muitas das situações de risco em que crianças e jovens estão envolvidos pois os estudos mostram que crianças e velhos constituem justamente os grupos mais vulneráveis.

Acresce que as condições de funcionamento as Comissões de Protecção de Crianças e Jovens que procuram fazer um trabalho eficaz estão longe de ser as mais eficazes e operam em circunstâncias difíceis. Na sua grande maioria as Comissões têm responsabilidades sobre um número de situações de risco ou comprovadas que transcendem a sua capacidade de resposta. A parte mais operacional das Comissões, a designada Comissão restrita, tem muitos técnicos a tempo parcial.

Alguns dados do Relatório de 2013, em 305 Comissões em actividade desempenhavam funções 2565 elementos na modalidade alargada, dos quais 2565 na modalidade restrita. O MEC tem nas 305 Comissões 272 professores a tempo inteiro ao abrigo do Protocolo com o Ministério da Solidariedade e Segurança Social. O MEC anunciou hoje que vai manter os docentes nestas funções e nas comissões que acompanhem mais que 1000 situações colocará um segundo docente com a função de mediador.

Como já referimos, o ano passado foram acompanhadas 71 567 crianças e jovens em risco, o número está em crescimento, os casos relativos ao direito à educação são dos que apresentam maior frequência e o MEC mantém para as 305 Comissões os 272 docentes a tempo inteiro colocando mais um docente apenas nas Comissões que lidam com mais de 1000 casos, uma enormidade. Não se entende e não se aceita, sobretudo quando sabemos que existem docentes sem horários lectivos e estão a ser empurrados para fora do sistema. Lamentável.

Tal dificuldade repercute-se, como é óbvio, na eficácia e qualidade do trabalho desenvolvido, independentemente do esforço e empenho dos profissionais que as integram.

Este cenário permite que ocorram situações, frequentemente com contornos dramáticos, envolvendo crianças e jovens que, sendo conhecida a sua condição de vulnerabilidade não tinham, ou não tiveram, o apoio e os procedimentos necessários. Ainda acontece que depois de alguns episódios mais graves se oiça uma expressão que me deixa particularmente incomodado, a criança estava “sinalizada” ou “referenciada” o que foi insuficiente para a adequada intervenção. Em Portugal sinalizamos e referenciamos com relativa facilidade, a grande dificuldade é minimizar ou resolver ou minimizar os problemas das crianças referenciadas ou sinalizadas.

Por isso, sendo importante registar uma aparente menor tolerância da comunidade aos maus tratos aos miúdos, também será fundamental que desenvolva a sua intolerância face à ausência de respostas.

Texto de Zé Morgado

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